O plástico, um elemento derivado do petróleo, tão novo na nossa história consegue ser um elemento sem o qual o nosso modo de de vida se torna inviável.
Dotado de grande maleabilidade o plástico é utilizado como matéria-prima para uma enorme variedade de objetos tais como embalagens, telhas, dinheiro, utensílios de cozinha (talheres, copos, pratos, eletrodomésticos em geral), equipamentos eletrônicos (computadores, celulares, etc.), chuveiros, brinquedos, peças de automóveis, sacolas, e até mesmo fazendo parte da composição de tecidos , além de produtos com pouquíssima utilidade mas que são muito populares no nosso dia-a-dia como os canudos, quase tudo à sua volta é feito de plástico ou tem algum detalhe importante em plástico.

O termo plástico inclusive deriva da palavra grega Plastikós que significa maleabilidade, plasticidade, uma das principais características do plástico que capaz de ser moldado em qualquer formato, em diferentes densidades, diferentes cores e níveis de flexibilidade.
O plástico tem sua origem associada ao sistema de vulcanização desenvolvido por Charles Goodyear em 1839, porém o plástico como conhecemos hoje só surgiu em 1907 através do primeiro polímero totalmente sintético chamado Baquelite criado pelo inventor e empresário belga Leo Baekeland e se popularizou após a Segunda Guerra Mundial, sendo portanto um elemento com pouco mais de 100 anos de vida, das quais aproximadamente 80 anos sendo utilizado em larga escala.

O primeiro grande estudo acerca do impacto do plástico nos oceanos foi realizado em 1997 por pesquisadores da Sea Education Society que estimaram que pelo menos 580.000 fragmentos plásticos flutuavam a cada km² do Oceano Atlântico, porém este estudo não considerou o percentual de fragmentos que afundam e que estima-se seja algo entre 50% e 70%, e segundo matérias do correspondente científico do jorna britânico The Independent Josh Gabbatus pesquisadores estimam que em 2050 haverá mais plástico no mar do que peixes.

Devido a capacidade de flutuar de parte destes fragmentos, eles acabam sendo carregados pelos sistemas de circulação oceânicos (giros oceânicos) e se acumulando no centro destes giros formando verdadeiras ilhas, sendo a maior delas a ilha formada no Pacifico Norte, entre a costa da California e o Havaí com cerca de 1,6 milhões de km² (o equivalente ao território de duas Franças) composta por algo em torno de 79.000 toneladas de fragmentos plásticos flutuantes.

A ilha de lixo plástico do Pacifo Norte é tão grande que em 2017 a ONG Plastic Oceans Foundation apresentou à ONU um projeto para inserir o território denominado de Trash Ilsles formado pelo plástico flutuante acumulado no Pacifico Norte como o 196º país membro da Organização. Este seria o único país cujo objetivo seria reduzir cada vez o tamanho do seu território e não o contrário. As Trash Isles possuem 240.910 cidadãos, dentre os quais Al Gore o primeiro a se naturalizar, Judi Dench, Mark Ruffalo e o Secretário Geral da ONU Antônio Guterres e seu porta-voz Stéphane Dujarric entre muitos outros, bandeira própria, passa porte, selos e moeda que é chamada de debris (dejetos em inglês).
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Bandeira de Trash Isles (Fonte: LAD BIBLE) Nota de 100 debris, passaporte e selos de Trash Isles (Fonte: LAD BIBLE) Nota de 20 dbris (Fonte: LAD BIBLE)
Além de acumular na superfície, o plástico enquanto se decompõe ele fragmenta em micropartículas diâmetro inferior a 5mm que são chamadas de microplásticos ou pellets e continuam impactando o meio ambiente e estes pellets além de chegar às praias e passarem a compor a areia, também estão se acumulando em determinadas áreas, dentre elas importantes áreas de berçário de peixes marinhos dentre os quais uma zona de berçário no arquipélago do Havaí onde pesquisadores determinaram que existem 7 pellets para cada filhote de peixe.

Estes fragmentos quando acumulados, flutuando em uma determinada área, podem formar uma massa que se assemelha para os peixes com massas formadas por elementos do plâncton que servem de alimento a estes filhotes de peixes, além de fornecer sombra e uma suposta proteção atraindo estes filhotes de peixe que estão ingerindo estes fragmentos.
Não só os filhotes de peixes se alimentam de fragmentos plásticos, peixes adultos também são capturados apresentando contaminação por estes fragmentos e acabamos consumindo sem saber estes peixes como evidencia um estudo publicado em 2016 e realizado por Daniele de A. Miranda e Gustavo Freire de Carvalho-Souza com peixes pescados no litoral soteropolitano encontrando pellets nos estômagos de cações (Rhizoprionodon lalandii) e de cavala (Scomberomorus cavala), peixes bastante comercializado e consumidos na cidade.

Mas o plástico não apresenta ameaça apenas aos peixes, as aves marinhas estão entre os animais mais impactados, estes animais são atraídos pelo colorido dos fragmentos, os ingerem e como a digestão total destes fragmentos não é possível muitos se acumulam no aparelho digestivo do animal impedindo que ele absorva nutrientes dos alimentos reais levando-os à morte por inanição. Este mesmo problema ocorre com tartarugas e mamíferos marinhos que confundem as sacolas plásticas flutuantes com presas e acabam ingerindo-os.
Em 1998 foi resgatada ainda com vida pelo Centro De Resgate de Mamíferos Aquáticos do Instituto mamíferos Aquáticos na praia do Canta Galo em Salvador uma fêmea adulta de golfinho-de-Risso (Grampus griseus), primeiro registro da ocorrência desta espécie para o litoral baiano, porém este animal vaio à óbito três dias depois e em sua necrópsia foram encontrados sacos plásticos cobrindo o estômago e impedindo a absorção de nutrientes.

Outras espécies marinhas também são impactadas usando lixo plástico como refúgio ou abrigo, como substrato, como carapaça e outras finalidades além de serem capturadas por restos de redes e outros petrechos plásticos de pesca alterando consideravelmente processos ecológicos importantes para a saúde dos recifes.


Como vimos, além de utilizar o plástico de forma indiscriminada no nosso dia-a-dia, este elemento ao prejudicar de tal forma a saúde dos oceanos também impactam na nossa saúde uma vez que este ambiente representa o principal fornecedor de oxigênio para a atmosfera, gás essencial para a nossa sobrevivência, além do fato que a grande quantidade de lixo plástico nos oceanos e a usa inclusão acidental na cadeia alimentar dos organismos que vivem neste ambiente acabam nos contaminando já que consumimos pescado.
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Canudos retirados da praia do Porto da Barra (Foto: Rodrigo Maia-Nogueira) Garrafa plástica encontrada no Parque Marinho da Barra (Foto: Rodrigo Maia-Nogueira) Gaveta de geladeira encontrada na praia da Boa Viagem (Foto: Rodrigo Maia-Nogueira)
A vida sem plástico no mundo atual é impossível, e algumas das consequências associadas ao acúmulo de plástico nos oceanos já são inevitáveis, porém alguns dos nossos hábitos nós podemos mudar para reduzir a magnitude destas consequências e evitar que outras passem a ser também inevitáveis. Evitar o uso de copos e utensílios plásticos (especialmente os descartáveis), não utilizar canudos plásticos, evitar produtos embalados em plásticos, priorizar as caixas de papelão e recusar as sacolas plásticas nos supermercados, colocar o lixo plástico nas lixeiras corretas (vermelhas) onde a coleta seletiva for efetiva, priorizar refrigerantes e sucos em garrafas de vidro, … bom, evitar ao máximo consumir plástico desnecessário e descartar os plásticos inevitáveis de forma consciente … e sempre que for à praia além de não deixar o seu lixo por lá colabore coletando ao seu redor todo e qualquer lixo deixado na areia, especialmente os plásticos, e mesmo que esse lixo não seja seu.

Lixus humanus, vamos extinguir esta espécie!!!!!
FONTES
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Autor(es)
Mergulhador e apaixonado pelos oceanos desde a infância.
Desde a década de 1990 está envolvido em ações e pesquisas relacionadas com a biota aquática, tendo sido coordenador de resgate do Centro de Resgate de Mamíferos Aquáticos (CRMA) do Instituto Mamíferos Aquáticos (IMA) e fundador do Centro de Pesquisa e Conservação dos Ecossistemas Aquáticos (Biota Aquática) e do EcoBioGeo Meio Ambiente & Mergulho Científico, e ao longo dos anos participou de projetos de pesquisa e de consultoria na ambiental em parceria com diversas instituições.
Também atua como instrutor de mergulho SDI e PADI.
Tem como objetivo, além de produzir informação de qualidade fomentar o reconhecimento e a qualificação dos mergulhadores científicos.